Assim, devo falar sobre Ricardo Leão Sabino, o patrono da Cadeira 36, para a qual, em votação e eleição, me conduziram meus confrades deste Instituto, por razões que a minha razão desconhece mas a minha gratidão reconhece. Obrigado, Confrades.
Quem era, quem foi Ricardo Leão Sabino e que papel na História lhe coube desempenhar e como o desempenhou, a ponto de, em sua homenagem, seu nome ter sido escolhido como patrono da cátedra que ora assumo no Instituto Histórico e Geográfico de Caxias?
No pouco tempo que me coube para pesquisar e tirar Ricardo Leão Sabino da relativa obscuridade dos espíritos pude confirmar: eu estava diante de uma pessoa fascinante, uma personalidade contraditória, uma personagem em busca de muitas histórias.
Para começo de conversa, diga-se logo que Ricardo Leão Sabino foi professor de Gonçalves Dias, quando este tinha de doze para treze anos de idade e até perto dos quinze, aqui em Caxias.
Ricardo Leão Sabino foi herói da Balaiada, em Caxias; foi amigo do Duque de Caxias e o acompanhou como militar em diversas guerras em diversos lugares; foi espadachim; foi cirurgião-dentista da Casa Imperial; foi titular de cartório, em São Paulo; criador de um comércio de peixe enlatado para exportação, em Santa Catarina; dono de um negócio de transporte de passageiros, movido a um trole e alguns animais, entre Paranaguá e Curitiba; foi fabricante de bonecos, em São Paulo; proprietário de um teatrinho para crianças na capital paulista e no Rio de Janeiro; foi pintor, desenhista, estatuário, músico, aventureiro, filósofo, arquiteto, carpinteiro, professor; escritor de diversos textos em jornais e autor de um só livro publicado.
Ao lado da variedade de negócios e atividades que exerceu, uma característica quase única: insucesso nos negócios e indevido reconhecimento nas atividades ligadas à oficialidade, ao Império -- como os postos e pensões militares que lhe negaram e os cartórios dos quais era serventuário, que não funcionaram.
Senhoras e Senhores:
Todos têm história. Poucos a contam.
Aqueles 16 fantasmas que caberiam a cada um de nós viventes têm muito mais faces, como as diversas de Ricardo Leão Sabino, posto que a geometria da vida vai tornando-nos, em diversos casos, seres múltiplos e vários. Cada um tornamo-nos uma espécie de hexadecaedro: um único ser, mas com 16 rostos.
A face histórica de Ricardo Leão Sabino começa a se antever a partir de sua ascendência, com seu pai, Joaquim José, e deixa-se perenizar com sua descendência, como, por exemplo, seu filho Horácio.
Enviei correspondência para escritora de São Paulo que conhece, na capital paulista, familiares descendentes de Ricardo Leão Sabino. Como ainda não obtive resposta, fica para outra oportunidade uma resenha biográfica com aspectos mais particularizados sobre ele.
De qualquer modo, as pesquisas que fiz me levaram a livros e autores desde as “Memórias” do Visconde de Taunay, o clássico “A Vida de Gonçalves Dias”, de 1943 (70 anos de lançamento, portanto, em 2013), escrito por Lúcia Miguel Pereira, até o depoimento do próprio Ricardo Leão Sabino, feito a Rodrigo Octávio Filho, que o registrou no pequeno livro intitulado “A Balaiada 1839”, passando por obras mais recentes, como “Elos de Uma Corrente, Seguidos de Novos Elos”, de 1994, escrito por Laura Oliveira Rodrigo Octávio, neta de Ricardo Leão Sabino e casada com Rodrigo Octávio Filho, e “Horácio Sabino: Urbanização e Histórias de São Paulo”, de 2008, livro de arte organizado por Carolina Andrade.
Assim, desse Ricardo Leão Sabino poliédrico, versátil, multifuncional, juntando os registros dispersos aqui e acolá, pode-se dizer, com segurança:
Ricardo Leão Sabino nasceu em São Luís, Maranhão, em 11 de abril de 1814. Há autores que dizem ser ele caxiense. Foi batizado duas semanas e meia depois, em 28 de abril de 1814. Era filho do desembargador Joaquim José Sabino de Resende Faria e Silva, português designado para prestar serviços no Maranhão, e de dona Josepha Adelaide Belfort, filha do engenheiro inglês e “lord” Philip Belfort e dona Adelaide Mattos.
Como se vê ou se lê ou se ouve, o futuro professor do caxiense Antônio Gonçalves Dias era para se chamar, salvo melhor juízo, Ricardo Belfort Faria e Silva. Só que bem antes de seu nascimento o pai, desembargador, tendo de assinar repetidamente montanhas de papeis tão longo nome -- Joaquim José Sabino de Resende Faria e Silva –, cortou-o ao meio e como Joaquim José Sabino foi que transmitiu o patronímico aos filhos e demais descendentes.
Sendo português seu pai, e tendo a família as devidas condições financeiras, Ricardo Leão Sabino foi mandado a Portugal, para estudar curso jurídico -- que ele não fez ou não terminou -- em Coimbra.
Aos 18 anos, encontrando-se em Porto, onde agora estudava, casou-se com a portuguesa Maria do Belém Correa, e ali mesmo em Porto alistou-se ao lado das tropas de dom Pedro 4º (no Brasil, dom Pedro 1º), que abdicara do Império brasileiro e lutava contra o próprio irmão, dom Miguel, considerado usurpador do reino de Portugal. Foi a chamada Guerra Civil Portuguesa.
Inteligente, entusiasmado, bom espadachim, saiu-se bem o maranhense nas diversas batalhas em diversas cidades portuguesas, participando de cercos, lutas e tomadas de localidades.
Afinal, em 1834, vencem as tropas de dom Pedro a Guerra Civil Portuguesa. Ricardo Sabino está lá, na condição de vencedor, na capitulação assinada por dom Miguel na freguesia de Évora-Monte.
Ricardo retorna ao Brasil, ao Maranhão, trazendo mulher, com quem veio a ter uma filha. Mais tarde ficará viúvo pelo menos duas vezes e se casará uma terceira vez e terá muitos filhos.
Não há registro do por que Ricardo Leão Sabino veio para Caxias, após deixar Portugal, filho de São Luís que era e com pai influente na capital. Foi a convite de amigos ou será se a Caxias da época o atraíra, pois que era tida como lugar progressista?
O certo é que foi aqui em Caxias que ele montou um curso onde ensinava Francês, Latim e Filosofia, e é neste espaço e tempo, em 1835, que sua vida interage decisivamente com a do sabido menino Antônio Gonçalves Dias, que se afastou do balcão do comércio que o pai João Manuel mantinha ali na esquina da Rua Benedito Leite (ou rua do Cisco) com a rua do Norte.
Não tardou para o professor Ricardo Leão perceber o talento do futuro poeta, dramaturgo, etnógrafo etc. e desde logo tornar-se seu entusiasmado defensor, a ponto de pedir dinheiro à madrasta do rapazola, dona Adelaide, e também a amigos em cotização para enviar o jovem a Coimbra e ali mantê-lo, onde melhor seu talento pudesse expandir-se.
Sempre um homem resoluto, Ricardo Leão Sabino ficou sabendo da vontade de um ferreiro português de voltar ao país natal. Era Bernardo de Castro e Silva, inquilino da madrasta de Gonçalves Dias, que lhe alugara um pequeno cômodo, “um puxadinho”, ali de junto da casa da família da agora viúva dona Adelaide.
Não contou conversa Ricardo Sabino. Como um leão, juntou o ferreiro e um Gonçalves Dias ainda com 15 anos incompletos, e no dia 13 de maio de 1838 saíram de Caxias em uma canoa rumo a São Luís, numa época em que a capital maranhense era a quarta maior cidade do Império e o Itapecuru não era essa vereda, esse fiapo de água de hoje, esse atestado de falência líquido e incerto da racionalidade humana, mas um verdadeiro rio de 45 metros de largura, caudaloso, piscoso, navegável. Hoje, o rio Itapecuru, igual a tantos outros, dá mais histórias do que peixe...
Em outubro de 1838, já com 15 anos completos, Gonçalves Dias chegava à Europa portuguesa. A história maior do menino começava ali, enquanto a vida de seu esforçado professor mantinha-se aqui.
Naquele mesmo ano de 1838 iniciava-se a revolta da Balaiada. Ricardo Leão Sabino deixava a fala pela bala, a sala pelo campo, os alunos pelos soldados. Naquela hora, a cidade de Caxias precisava menos do denodado professor e mais, muito mais, do experiente militar, que lutara e ganhara tantas lutas em terras de Portugal. Era o único com tal e tamanho currículo.
O episódio do estratagema da flauta, com o qual botou a correr os balaios, valeu-lhe ecos de admiração e patente de capitão. Admiração da província e patente do Exército, além do hábito de Cavaleiro da Ordem do Cruzeiro e uma pensão mensal em dinheiro.
Essa ardilosa manobra contra os balaios deu-se porque, entre tantas coisas que era, Sabino também era músico, professor de flauta e rabeca. Suas tropas estavam ali ao lado da Igreja de São Benedito (igreja de cujo sistema de som ouvi, em finais de setembro de 1978, o padre Mendes anunciar o falecimento do papa João Paulo 1º, anúncio seguido de exclamação de surpresa de minha professora e vizinha de quintal, Tia Filozinha).
Sentindo que suas tropas não poderiam resistir mais ao cerco balaio, Ricardo Leão engendrou o artifício de dirigir-se aos revoltosos, aparentando passar para o lado deles; disse-lhes algumas palavras, chamou os balaios para mais perto de si e, com a flauta, tocou o Hino Nacional, ao qual, como se fosse senha ou sinal, logo se sucederam disparos à queima-roupa contra os revoltosos e tiro de canhão, que mataram muitos balaios e provocaram pânico e correria, tal o estrondo e o estrago feitos e o medo de que atrás daquele tiro de canhão viessem outros -- mas não vieram: era aquele o último recurso do façanhudo Ricardo Leão Sabino, que depois foi justamente chamado de “herói da Balaiada”.
Como se vê, a situação era séria, mas pode-se dizer que o sestroso Sabino levou os inimigos... na flauta.
A impressionante e criativa proeza do talentoso Sabino levou-o à amizade com o à época presidente da província e comandante das forças armadas do Maranhão, Luís Alves de Lima e Silva, o futuro Duque de Caxias, de quem Ricardo Leão tornou-se, além de amigo, seguidor e ao lado de quem lutou muitas lutas, batalhas, guerras, Brasil adentro e país afora, a ponto mesmo de ser ferido a bala umas cinco vezes e ter sido morto João, um dos filhos que levou para essas lutas.
Vitorioso moral e militarmente, Ricardo Leão Sabino, entretanto, saiu financeiramente pobre dessas batalhas. Soube, durante uma delas, em 8 de novembro de 1843, que seu pai e sua mulher haviam morrido no Maranhão e prometeu a si mesmo não mais voltar à sua terra natal.
Nos idos dos anos 1870 e em diante Ricardo Leão Sabino era um homem sem maiores recursos financeiros e com muitos filhos para criar.
Tentou de tudo, menos a desonestidade.
Houve momentos tão críticos que, enquanto ele procurava ganhar algo em outros lugares para sustentar a família, sua esposa e filhos tinham de fazer costuras e tinham de tirar uma espécie de líquido de flores de laranjeiras para vender, talvez para uso em boticas ou indústrias cosméticas. Com o pouco apurado, a família de Ricardo Sabino comprava o bocado de cada dia.
Seu temperamento forte não admitia humilhação. Perdeu postos militares para si e para seus filhos por causa de sua postura firme e sincera, mesmo diante de autoridades superiores. Escrevia cartas em jornais cobrando explicações e direitos -- até para o Imperador. Anunciava seus talentos de dentista diplomado, professor de música e de línguas e seus teatrinhos de bonecos para crianças. Não desistia.
Em 1895 publicou seu único livro, “Deus e Alma”, uma raridade no mercado bibliográfico.
Querendo rever lugares por onde passou, fez um pedido a seu filho Horácio Belfort Sabino. Horácio era homem de espírito empreendedor, considerado o grande responsável pela urbanização de São Paulo (há anos a maior cidade do país, com seus 11 milhões de habitantes e 1.500 quilômetros de área, território quase quatro vezes menor do que o de Caxias). Pediu o velho Ricardo que Horácio o levasse a Portugal. Ali, em Lisboa, em 17 de abril de 1902, seis dias após completar 88 anos, já surdo, quase cego e doente de pneumonia, veio a falecer. Depois, seus restos mortais foram trasladados para o Brasil.
Apesar de sua vontade de rever as terras portuguesas onde estudou, casou-se e lutou ao lado de dom Pedro 1º, apesar do golpe pela perda no Maranhão de dois entes queridos (pai e esposa, em 1843), apesar de ter jurado não voltar mais para a pátria maranhense, o Maranhão nunca deixou o coração, a alma e a mente de Ricardo Leão Sabino. Em uma correspondência datada de 8 de agosto de 1901, endereçada ao esposo de uma de suas netas, o velho Leão de tantas guerras, muita luta e pouco reconhecimento material em vida, diz com todas as letras que queria voltar para cá, queria estar junto de nós. O Maranhão do início do século 20 era uma província mais livre e melhor, pelo menos em relação aos sufocos bélicos e fratricidas pelos quais passara.
Diz o quase nonagenário Ricardo Leão em um trecho da carta:
“Continuo no mesmo estado, muito surdo, quase cego, só leio e mal com uma forte lente. 88 anos, durmo e como bem, ando em velocípede, isto é, regulando o equilíbrio; se fecho os olhos caio, de noite logo que o sol se recolhe fico cego de todo, por isso não saio de casa. A inteligência é muito clara, a memória quase perdida, um nome que se me diz, se não escrevo, cinco minutos depois já não me lembro! Ainda faço versos, mas é preciso ir escrevendo à medida que vou fazendo."
“Moramos com meu filho Horácio na Avenida Paulista, mas cartas não vêm aqui e sim Vila Buarque, rua General Jardim, 42, casa de minha filha Amélia.”
E quase ao final, expressa o velho guerreiro, 252 dias antes de morrer: “Desejo muito retirar-me para o Maranhão, a fugir do frio que já não suporto. São Paulo está sempre em movimento, bondes elétricos etc. Para mim é tarde!”
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Caxias não é apenas, mas também, terra e rima de GONÇALVES DIAS, nosso poeta de referência, etnógrafo, professor, fundador do Indianismo na literatura brasílica.
Somos a cidade do autor da Bandeira Brasileira, TEIXEIRA MENDES, sem o qual correríamos o risco de ter, como nossa, a bandeira dos Estados Unidos... pintada de verde e amarelo... -- que, aliás, perdurou por quatro dias, de 15 a 18 de novembro de 1889, até o caxiense entregar e defender a nova bandeira no dia 19, ainda hoje o Dia da Bandeira Nacional.
Somos a cidade em que se inspirou o Patrono do Exército Brasileiro, Luís Alves de Lima e Silva, para ter seu título de nobreza, de Barão a Duque de Caxias.
Somos a cidade cujo nome -- Caxias -- deu origem ao nome de duas outras grandes cidades brasileiras, uma no Rio Grande do Sul, cuja economia é dez vezes maior do que a nossa, e a outra no Rio de Janeiro, cuja economia é vinte vezes maior do que a do nosso município caxiense. Mas Economia, sozinha, não sustenta uma cidade se ela não tiver como base e lastro a força da História e a identidade da Cultura de um povo.
Somos a cidade do Príncipe dos Prosadores Brasileiros, COELHO NETO, 150 anos de nascimento agora em fevereiro de 2014, um raro caso, senão único, de caxiense, maranhense e brasileiro para o qual os argentinos curvaram-se em reverência a seu talento, convidado para dar palestras naquela grande nação sul-americana. E o que Caxias está fazendo, desde agora, para dizer ao mundo Brasil que Coelho Neto é caxiense?
E, nestes tempos em que tanto se fala da Copa do Mundo de 2014, no Brasil, vale lembrar que foi um filho do caxiense Coelho Neto, João, apelidado “Preguinho”, o autor do primeiro gol da Seleção Brasileira de futebol em Copa do Mundo.
Caxias é a cidade do médico e historiador de referência estadual e nacional, CÉSAR MARQUES -- patrono deste Instituto. Do poeta de “Cousa Alguma...”, VESPASIANO RAMOS.
Somos a cidade da família do fundador da universidade privada mais antiga do Brasil, a Universidade CÂNDIDO MENDES, no Rio de Janeiro, que é do início do século 20.
Somos a terra do odontólogo considerado “Glória da Odontologia Nacional”, ADERSON FERRO. E é de deixar de boca aberta o que Caxias desconhece e não faz para reassumir a maternidade desse ilustre filho, reconhecido e homenageado em outros lugares -- mas não aqui.
Somos a terra do advogado e abolicionista redator da Lei do Ventre Livre, também considerado o jornalista mais completo do Brasil de todos os tempos, JOÃO MENDES DE ALMEIDA -- que tem busto e praça com seu nome na maior cidade brasileira, São Paulo, além do nome de seu filho, João Mendes de Almeida Júnior, dado ao fórum paulistano... enquanto em Caxias quem sabe dele?, Quem o estuda?, Que escola ou rua ou praça recebe seu nome?, Que homenagens lhe são creditadas?, Que honrarias lhe são, mesmo pós-morte, atribuídas?
Somos a terra de ANDRESA MARIA DE SOUSA RAMOS, a Mãe Andresa, sacerdotisa de culto afro-brasileiro de renome internacional, última princesa da linhagem direta fon, que comandou durante 40 anos a Casa de Mina em São Luís, até morrer em 1954, aos cem anos de idade. Escritores, sociólogos e antropólogos brasileiros e estrangeiros escreveram sobre Mãe Andresa, cujos cem anos de vida é o mesmo tempo de esquecimento pelos caxienses, que sobre ela nada escreveram, e pelas sucessivas autoridades locais, que nem disso se interessam por saber. O que aqui se sabe e o que aqui se faz acerca de Mãe Andresa?
Somos a terra do grande UBIRAJARA FIDALGO DA SILVA, o primeiro dramaturgo negro brasileiro, ator, diretor, produtor, bailarino, apresentador de TV e criador do Teatro Profissional do Negro, reconhecido e homenageado nos grandes centros brasileiros como Rio de Janeiro e São Paulo. Enquanto isso, em Caxias, quem sabe da existência de tamanho talento, falecido em 1986, no Rio de Janeiro? Quem de Caxias ou do Maranhão já patrocinou montagem de suas peças, a edição de seus textos, encenados e inéditos? Qual autoridade caxiense bancou uma exposição sobre seus trabalhos, a exibição de documentários sobre Ubirajara Fidalgo, desconhecido em vida pelos caxienses e não reconhecido após a morte, e cuja filha, a cineasta Sabrina Fidalgo, luta pela preservação e divulgação da obra de seu pai e nosso conterrâneo?
Somos a terra de CÂNDIDO RIBEIRO, considerado “o maior industrial do Maranhão dos séculos 19 e 20”. Quem dos caxienses sabe da vida deste empreendedor, do que fez em seu tempo, das inovações que implantou, das tecnologias que no estrangeiro estudou e no Maranhão e no Ceará as adotou? Que instituição empresarial e coisa e tal já o homenageou, deu-lhe o nome a um prédio, sala, biblioteca, auditório, e que curso de Administração, Economia, Contabilidade o coloca como nome de turma em formatura ou pelo menos como conteúdo transversal, tema de palestra?
Em Caxias nasceu CÉSAR FERREIRA OLIVEIRA, “revolucionário constitucionalista” em São Paulo e “Herói da Guerra de Canudos”. Em Caxias nasceu JOÃO CHRISTINO CRUZ, criador do Ministério da Agricultura, agrônomo que fez estudos em outros países e é o presidente de honra da Sociedade Nacional de Agricultura.
Caxias é cidade de fundadores de cidades. Dois exemplos: aqui nasceram CARLOS GOMES LEITÃO, magistrado, político, fundador do município paraense de Marabá, em 1894, e de ELIAS FERREIRA BARROS, fundador, em 1809, de Carolina, um dos maiores paraísos turísticos do Maranhão.
Somos a terra de ELPÍDIO PEREIRA, maestro e músico de renome internacional, autor do Hino caxiense, estudou e apresentou-se na França e em diversos estados brasileiros -- mas, em Caxias... Caxias não se toca.
Somos a terra de JOÃO LOPES DE CARVALHO, pintor e desenhista, que estudou sua arte em Portugal, onde, por seu grande talento, já aos 16 anos, em 1862, foi elogiado por muitos jornais de Lisboa. Mas nada se sabe dele em Caxias. Aqui ele não pinta no pedaço...
Caxias é a terra de JOAQUIM ANTÔNIO CRUZ, médico, militar e político, participou da demarcação de fronteira do Brasil com a Argentina e votou pela lei que terminou por abolir os castigos corporais nas Forças Armadas. Em Caxias, o castigo a esse nome permanece, aplicado com o látego do esquecimento.
Foi em Caxias que nasceu um dos mais realizadores governadores do Estado: PAULO RAMOS, advogado, deputado federal, interventor e governador do Maranhão, criador, entre outras instituições, do Banco do Estado do Maranhão e da Rádio Timbira.
Caxias é a orgulhosa terra de TEÓFILO DIAS, advogado, jornalista e escritor, introdutor do Parnasianismo no país e colocado por Sílvio Romero entre os “quatro dos maiores poetas do Brasil”. Quem lê e quem declama Teófilo Dias? Alguma empresa ou órgão público reeditou suas obras?
Somos a terra de SINVAL ODORICO DE MOURA, bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais, ainda hoje um raro caso de alguém que governou quatro estados – Amazonas, Ceará, Paraíba e Piauí. Para um homem desse tamanho, a lembrança que Caxias lhe manda é a retirada de seu nome da rua Conselheiro Sinval, em um estranho jogo de camarilha político-partidário-institucional onde de um lado joga-se falta de critério e excesso de bajulação e, do outro lado, a desconsideração à História e o desrespeito à tradição. Grande obra essa de mudarem-se placas com tanta facilidade e displicência como se nossas ruas e avenidas fossem automóveis de contraventores. Mudam-se, à vontade de grupos, as denominações de uma mesma rua como se faltassem ruas e outros logradouros ainda sem nomes oficiais...
Exceto pela lembrança do patronato de uma cadeira na Academia Caxiense de Letras, somos a terra-mãe ingrata ao filho CELSO ANTÔNIO SILVEIRA DE MENEZES, pintor, professor, escritor, um dos precursores da arte moderna no país, considerado um dos maiores escultores do Brasil, elogiado por Manuel Bandeira, Coelho Neto, Carlos Drummond de Andrade e Otto Lara Resende. Aliás, foi Otto Lara Resende que, indignado com a falta de reconhecimento ao talentoso escultor caxiense, escreveu em manifesto:
“Como simples testemunha do meu tempo, considero um absurdo que até hoje, no final de 1989, um artista do valor e da importância de Celso Antônio não tenha tido ainda o reconhecimento que merece. É sabido que a morte impõe um período de silêncio, como se entre a posteridade e o morto ilustre fosse necessário fazer uma reflexão para reavaliar o que significou de fato a sua contribuição para a cultura nacional.
Quem quer que tenha interesse pelas artes e pelas letras no Brasil sabe a importância de Celso Antônio. Nem é preciso ter sido seu contemporâneo, ou ter acompanhado, mesmo à distância, o itinerário que o artista percorreu. Não lhe faltou sequer o sal da grande controvérsia, quando sua arte foi vítima da incompreensão e da burrice.
Celso Antônio, tendo vivido e trabalhado num momento de renovação cultural em todas as frentes, foi um grande artista inovador. Com um temperamento discreto, alheio ao marketing das celebridades de quinze minutos, o grande artista teve ao seu lado as melhores inteligências e sensibilidades do seu tempo. Bastaria citar três grandes nomes, entre os seus fervorosos admiradores: Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade e Rodrigo M. F. de Andrade.
Tudo o que se fizer em favor de Celso Antônio, a partir de agora, é justo e oportuno. Chega tarde, mas ainda chega a tempo de saldar uma dívida que o Brasil tem para com esse extraordinário artista, que conheci, admirei e defendi, quando foi vítima da agressiva estupidez dos que se trancam na rotina e no ar viciado do academicismo".
Senhoras e Senhores: Quando um nome da credibilidade e da altura intelectual de Otto Lara Resende escreve isso de um conterrâneo nosso, onde devemos pôr a nossa cara?
E muito poderíamos dizer acerca de tantos que já morreram fisicamente, entre os quais ABREU SOBRINHO (jornalista, ex-prefeito de Eugênio Barros), ADERSON GUIMARÃES (cônego, latinista, jornalista, professor), ALDERICO SILVA (empresário pioneiro, jornalista, acadêmico), ANICETO CRUZ (empresário pioneiro, jornalista), BENEDITO JOAQUIM DA SILVA (primeiro prefeito de Caxias pós-Revolução de 1930), CID ABREU (escritor, professor, latinista, acadêmico), CLÓVIS VIDIGAL (monsenhor, educador), DÉO SILVA (poeta, jornalista), DIAS CARNEIRO (os dois: o industrial e jornalista e o magistrado e desembargador), ELEAZAR SOARES CAMPOS (advogado, professor, magistrado, escritor, interventor federal do Maranhão), FLÁVIO TEIXEIRA DE ABREU (advogado, jornalista, escritor, poeta, professor), GENTIL MENESES (administrador, jornalista, escritor), HERÁCLITO RAMOS (jornalista, escritor, poeta; irmão de Vespasiano Ramos), KLEBER MOREIRA DE SOUSA (jornalista), LAURA ROSA (poeta, escritora), LIBÂNIO LOBO (escritor, acadêmico), MARCELLO THADEU DE ASSUMPÇÃO (médico humanitário, professor, criador e mantenedor de escola gratuita, prefeito de Caxias), NEREU BITTENCOURT (professor, escritor), NILO CRUZ (magistrado, desembargador), ODORICO ANTÔNIO DE MESQUITA (advogado, político, magistrado), OSMAR RODRIGUES MARQUES (jornalista e escritor), RAIMUNDO FONSECA FREITAS NETO (poeta), SINÉSIO SANTOS (fotógrafo), TIA FILOZINHA (Filomena Machado Teixeira, professora), VÍTOR GONÇALVES NETO (jornalista, escritor), WALFREDO DE LOYOLA MACHADO (jornalista, bacharel em Direito, escritor), WILSON EGÍDIO DOS SANTOS (professor universitário, escritor, odontólogo)...
Agora mesmo temos gente viva (não confundir com gente esperta...), quatro mulheres caxienses, que, voluntária ou involuntariamente, contribuem para repor ou remarcar uma parte do “status” de nossa terra como destaque nacional senão internacional: ALINE DE LIMA, cantora de destaque na França e em outros dez países; BRUNA GAGLIANONE, bailarina de destaque, premiada pelo Balé Bolshoi, de cujo corpo de dançarinos do Teatro Bolshoi agora faz parte, na Rússia, segundo ela própria me confirmou na data de hoje; MARISE CASTRO, ainda criança, eleita em 2010 mini-miss beleza mundial; e TITA DO REGO SILVA, destaque na Alemanha em Artes Plásticas.
Seja na Administração (Empresarial e Pública), nas Artes, na Cultura, no Direito e Justiça, na Literatura, Música, Beleza (temos nossas misses caxienses), a relação não intencional e aleatória dos nomes anteriores é só uma impressão digital, marca pequena no grande “corpus” cultural, artístico, político, histórico e social do município caxiense. É patente que o céu histórico-cultural de Caxias tem mais estrelas. Muito mais
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As palmas são para os milhares de talentosos e corajosos caxienses que, no passado, de 400 anos para cá, na sua terra ou fora dela, fizeram coisas ou defenderam causas que se agregaram ao patrimônio comum do incontido orgulho de sermos caxienses.
Muito obrigado.
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O texto aqui apresentado é apenas um trecho do pronunciamento de posse do escritor Edmilson Sanches no Instituto Histórico e Geográfico de Caxias. A íntegra do discurso pode ser solicitada via Facebook ou pelo e-mail esanches@jupiter.com.br.
Caxias, Maranhão, 13 de dezembro de 2013
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O texto aqui apresentado é apenas um trecho do pronunciamento de posse do escritor Edmilson Sanches no Instituto Histórico e Geográfico de Caxias. A íntegra do discurso pode ser solicitada via Facebook ou pelo e-mail esanches@jupiter.com.br.
Belo textos,ela vai mexer lá dentro da nossa alma de maranhense,muito gostosa de se ler.
ResponderExcluirO encanto de Caxias está na cultura e nas historias de seu povo, A princesa do sertão precisa que alguém olhe para ela com mais sensibilidade. Olhar de poeta. O patrimônio natural, cultural e histórico de Caxias é imenso. Excelente texto que merece ser espalhado nas escolas, divulgado, destrinchado pelos jovens para despertar o sentimento de amor a cidade. Luiz Oliveira
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